Com apoio da Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais (SES-MG), por meio da Superintendência Regional de Saúde (SRS) de Montes Claros, os municípios de Espinosa e Porteirinha concluem, na próxima terça-feira, 5 de março, a Semana de Formação em doença de Chagas. Os trabalhos foram iniciados no dia 26 de fevereiro, por meio do Projeto IntegraChagas Brasil, com a oferta de cursos formativos a profissionais de saúde que atuam em serviços de atenção primária.

A partir de pesquisa estratégica financiada e demandada pelo Ministério da Saúde (MS), o Projeto IntegraChagas tem o objetivo de ampliar o acesso da população à detecção e tratamento da doença de Chagas no âmbito dos serviços de Atenção Primária à Saúde (APS), por meio da integração de ações com os serviços de Vigilância em Saúde.  Através da qualificação da rede de atenção à saúde, o objetivo do Ministério da Saúde é estabelecer um percurso assistencial padronizado, com foco em ações de promoção da saúde, prevenção, tratamento e reabilitação de pacientes acometidos pela doença. 

Porteirinha e Espinosa foram incluídos entre os cinco municípios prioritários para a execução do IntegraChagas Brasil. As demais localidades participantes do projeto são: Iguaracy (Pernambuco); São Luiz de Montes Belos (Goiás) e São Desidério (Bahia). 

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A Semana de Formação antecede a cerimônia de lançamento do projeto IntegraChagas Brasil nos dois municípios. Dia 7 de março, a partir das 15 horas, no Centro Cultural de Porteirinha, e no dia 8, a partir das 17 horas, na Associação Atlética Banco do Brasil (AABB) de Espinosa. Nesta oportunidade estarão presentes dirigentes da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Ministério da Saúde, Governo do Estado e de movimentos sociais 

A Semana de Formação contempla quatro áreas: Teste Rápido e Aconselhamento em Doença de Chagas, implementado por profissionais do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), unidade da Fiocruz; Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Universidade Federal do Ceará (UFC); Processo de Trabalho no Território, em parceria com UFBA e UFC;  Manejo Clínico em Doença de Chagas, conduzido pelo Instituto Nacional de Infectologia da Fiocruz e UFC; e Cuidado e Aconselhamento em Doença de Chagas no Território, em parceria com UFBA e UFC.

No total foram ofertadas vagas para mais de 200 pessoas que atuam como profissionais de saúde e que estão sendo capacitadas para a atenção às pessoas acometidas pela doença de Chagas, visando ampliar o acesso a diagnóstico e tratamento por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

A referência técnica em doença de chagas na Superintendência Regional de Saúde de Montes Claros, Nilce Almeida Lima Fagundes, explica que “o objetivo da Semana de Formação é a preparação das equipes de saúde para o início das atividades envolvendo a aplicação do teste rápido de triagem para doença de Chagas e o planejamento do atendimento integral das pessoas acometidas pela doença”. A referência técnica acrescenta que “todo esse processo de cuidado será realizado nas unidades de Atenção Primária à Saúde, a partir da implementação do protocolo da linha de cuidado para a doença, que foi desenvolvido pelos grupos gestores de Espinosa e Porteirinha, em parceria com o projeto IntegraChagas Brasil”.

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O professor  Alberto Novaes, um dos coordenadores do IntegraChaga, salienta que  “o projeto constitui uma pesquisa estratégica do Ministério da Saúde, iniciativa pioneira e participativa, que busca integrar saúde e ambiente, vigilância e atenção à saúde, em um movimento para diagnosticar e cuidar das pessoas acometidas pela doença de Chagas”.

Para a agente comunitária de saúde de Espinosa, Sandra Carlos, que participou dos cursos de Cuidados e Aconselhamento em Doença de Chagas do Território e Processo de Trabalho no Território, “o melhor foi o aprendizado, pois descobri que muita coisa é diferente do que eu achava. Sempre que encontrava um barbeiro eu matava e agora sei que preciso capturar ele vivo e levar para o centro de zoonoses, além de passar a saber que a doença que tem tratamento”.

Josefa Romerca Cantuária, de 69 anos, que convive com a doença de Chagas, ficou feliz em poder colaborar com o curso de teste rápido. “Fico feliz em poder contribuir com a evolução da ciência e mais ainda em saber que a doença de Chagas está tendo atenção, porque a gente sabe que existe muita negligência, mas agora está mudando”.

 

Visibilidade

Para o médico do Instituto Nacional de Infectologia, Alejandro Hasslocher, que ministrou o curso de Manejo Clínico em Doença de Chagas, esta é uma doença que, além de negligenciada, é silenciosa, pois ninguém sabe onde estão as pessoas com Chagas. 

“Esse trabalho vai permitir trazer à tona essa população com doença de Chagas que precisa de atenção, tratamento, orientação e acompanhamento. O projeto está fazendo isso de maneira efetiva e sustentável porque o Integra vai embora, mas a rede de saúde local e regional continuará seguindo com este trabalho”, destacou o médico.

 

Testes rápidos

O gerente de Desenvolvimento de Diagnóstico de Bio-Manguinhos, Edmilson Domingos, lembrou que, além do desenvolvimento dos testes, a organização também realiza a capacitação de profissionais. “Esse apoio ao projeto IntegraChagas é muito importante. Nossa atuação não se restringe ao laboratório, mas também atuamos com treinamentos, eventos, cursos e capacitações visando uma melhor utilização dos nossos produtos pelos profissionais de saúde para melhor atender nossa população”.

A enfermeira, Lucimara Alexandre Sandre, que participou do curso de Teste Rápido e Aconselhamento em Doença de Chagas em Porteirinha, acredita que, quando o teste rápido chegar às unidades de saúde, facilitará muito o diagnóstico da doença. “Ele vai ficar mais próximo da nossa população. Nós precisamos muito desses testes na nossa unidade para identificarmos os possíveis pacientes com Chagas”.

 

Avanço tecnológico

Atualmente a confirmação laboratorial da doença de Chagas é feita por exames parasitológicos, que buscam observar o parasito Trypanosoma cruzi em amostras de sangue. “Em comparação, o teste molecular é mais sensível, pois consegue identificar a infecção mesmo com o fragmento de um parasito na amostra, o que não é possível no exame parasitológico”, observa Constança Felícia Britto, coordenadora do Laboratório de Biologia Molecular e Doenças Endêmicas do Instituto Oswaldo Cruz.

A identificação do Trypanosoma cruzi com o Kit NAT Chagas também é feita a partir de amostras de sangue. O procedimento demora entre quatro a cinco horas e pode ser executado em qualquer laboratório equipado para aplicar a metodologia PCR. Isso permite a descentralização do diagnóstico e agilidade na obtenção de resultados, além da padronização dos testes utilizados em diferentes centros.

Devido à alta sensibilidade e especificidade, o diagnóstico molecular pode trazer avanços para a identificação de casos agudos de doença de Chagas, especialmente em recém-nascidos, que podem contrair a infecção durante a gestação ou no parto, quando a mãe é portadora do Trypanosoma cruzi. A doença também pode ser diagnosticada durante surtos de infecção oral, que atualmente constituem a forma mais comum de transmissão devido à ingestão de alimentos contaminados.

“Esperamos que o Kit NAT Chagas possa aumentar o acesso ao diagnóstico e, consequentemente, ao tratamento das pessoas com doença de Chagas, que são negligenciadas e têm dificuldade de acesso à saúde”, pontua Constança Britto. 

 

A doença

A coordenadora de vigilância em saúde da Superintendência Regional de Saúde de Montes Claros, Agna Soares da Silva Menezes, explica que, assim como outras doenças negligenciadas, Chagas está associada a condições de vida de vulnerabilidade. A doença é transmitida pelos insetos triatomíneos, popularmente chamados de barbeiros.

“Trata-se de uma das doenças tropicais negligenciadas mais silenciadas. Estima-se que, no mundo, entre 6 e 8 milhões de pessoas têm a doença e mais de 75 milhões moram em áreas de risco de contágio”, explica a coordenadora. Ela observa que, diante da grandeza dos números do cenário epidemiológico, a doença precisa de permanente atenção por parte do poder público.

Estimativa da Fiocruz aponta que aproximadamente 12 mil pessoas morrem anualmente por causa de Chagas em todo o mundo. Desse total, cerca de 8 mil óbitos têm como vítimas bebês que se infectaram durante a gravidez ou no parto.

Por Pedro Ricardo / Fotos: Projeto IntegraChagas Brasil