Na quarta-feira, 19 de julho, Montes Claros sediou o lançamento em Minas Gerais do Projeto Cuida Chagas – Comunidades Unidas para Inovação, Desenvolvimento e Atenção para a Doença de Chagas. Em Janaúba, segundo município mineiro pioneiro na implementação do Projeto, o lançamento foi na quinta-feira, 20 de julho.

O Cuida Chagas é uma iniciativa internacional inovadora, financiada pela Unitaid, agência global ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS) que, no Brasil, Bolívia, Colômbia, e Paraguai, vai colocar em prática a realização do diagnóstico precoce da doença de Chagas com a utilização de testes rápidos. Até 2025, pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com apoio de profissionais de saúde de serviços de atenção primária dos municípios selecionados, vão definir quais testes rápidos são mais eficazes para o diagnóstico e as melhores formas de tratamento clínico de pacientes, que poderão ser replicadas em diferentes contextos. A proposta é reduzir o tempo de tratamento entre 30 e 60 dias, antes que a doença evolua para a fase crônica com complicações cardiológicas e digestivas.

O lançamento do Projeto Cuida Chagas foi realizado no auditório do Centro de Ciências Humanas da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), com a participação de técnicos das coordenadorias de Atenção à Saúde e de Vigilância Epidemiológica da Superintendência Regional de Saúde (SRS) de Montes Claros, professores da Universidade e pesquisadores que atuam no ambulatório de Chagas administrado pelo Hospital Universitário Clemente de Faria.

19.07.2023 MontesClaros CuidaChagas

O vice-reitor da Unimontes, Dalton Caldeira Rocha, destacou a importância do incremento de parcerias entre a instituição e outras entidades de pesquisas. “O Hospital Universitário realiza por ano mais de 557 mil procedimentos, e as parcerias para a realização de atividades de ensino, pesquisa, e extensão, tornam evidentes para a sociedade a importância dos investimentos em instituições públicas de saúde”, disse.

Andrea Silvestre, investigadora principal do Projeto Cuida Chagas, chamou atenção para a importância de Minas Gerais ter sido o estado escolhido para o lançamento do projeto. “Foi aqui, há 114 anos, que a doença foi descoberta pelo pesquisador Carlos Chagas. Mesmo com avanços obtidos nos últimos anos, temos o desafio de viabilizar a utilização de testes rápidos que possibilitem o diagnóstico precoce da doença de Chagas que, juntamente com a dengue, esquistossomose, e leishmaniose, está entre as doenças tropicais mais negligenciadas. Isso traz um grande impacto nos serviços de saúde, devido à ocorrência de cerca de 500 mil óbitos por ano, visto que apenas cerca de 10% dos diagnósticos acontecem precocemente”, ressaltou a pesquisadora.

Andrea Silvestre lembrou que não só na América Latina, mas em todos os cinco continentes, a doença de Chagas tem sido detectada, em virtude da constante migração de pessoas, da transmissão congênita de mãe para filhos, além do diagnóstico tardio. “Com a evolução dos processos de urbanização e de globalização, e sem investimentos em pesquisas, não há condições de se estabelecer políticas públicas para o enfrentamento da doença, pois não há como quantificar o número de pessoas a serem atendidas”, pontuou a pesquisadora.

A diretora do Projeto Cuida Chagas, Debbie Vermeij destacou que o engajamento da sociedade civil na busca do diagnóstico rápido, tratamento, e implementação de políticas públicas para o enfrentamento da doença de Chagas é um diferencial que os pesquisadores estão trabalhando atualmente. Nesse contexto, os profissionais dos serviços de atenção primária terão condições de contribuir com a definição e validação dos testes rápidos e manejos clínicos mais eficientes para agilizar o diagnóstico e tratamento de pacientes.

O coordenador do ambulatório da doença de Chagas do Hospital Universitário Clemente de Faria, Luciano Freitas, observou que “o desafio para o controle da doença de Chagas é grande, uma vez que se trata de uma doença negligenciada tanto no aspecto clínico como social”. No caso específico do Norte de Minas, em seis meses de atuação o ambulatório já cadastrou sete mil pessoas portadoras da doença, encaminhadas por serviços de atenção primária à saúde.

A referência técnica da Superintendência Regional de Saúde de Montes Claros, Nilce Almeida Fagundes Lima entende que “a integração de ações de instituições como Fiocruz, Unitaid, Unimontes e a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) é fundamental para superar os impactos que a doença de Chagas ainda causa no Norte de Minas”.

Agna Soares da Silva Menezes, coordenadora de vigilância em saúde da SRS, lembrou que “pelo fato da doença de Chagas ser uma da mais negligenciadas, a implementação de projetos voltados para o diagnóstico precoce e tratamento da doença reforça a importância da discussão do problema entre os profissionais de saúde e em outros segmentos da sociedade”.

O projeto

Por meio de uma estratégia que combina estudos de implementação e inovação, engajamento comunitário e intervenção no mercado, o projeto busca contribuir para a eliminação da transmissão vertical da doença de Chagas. Nesse contexto, mulheres em idade fértil, crianças e contatos domiciliares serão os principais beneficiários de um conjunto de intervenções.

Também participam do projeto a Fundação para o Desenvolvimento Científico Tecnológico em Saúde (Fiotec), que atua em parceria com o Instituto Nacional de Laboratórios de Salud (INLASA), sediado na Bolívia; o Instituto Nacional de Salud (INS), da Colômbia; o Servicio Nacional de Erradicación del Paludismo (SENEPA), do Paraguai; e a Aliança Global para Diagnósticos – (FIND). Além do financiamento da Unitaid, o Cuida Brasil é cofinanciado pelo Ministério da Saúde (MS).

Além de Montes Claros e Janaúba, no Norte de Minas, o projeto contemplará os municípios de Rosário do Sul (Rio Grande do Sul), Paraúna (Goiás) e Riachão das Neves (Bahia). O objetivo é reduzir o tempo de identificação de pessoas portadoras da doença e viabilizar o início do tratamento de um agravo que, anualmente, apesar de ter cura, é responsável pela morte de, aproximadamente, 500 mil pessoas. Dados da Fiocruz estimam que a doença é uma das principais causas de morte por doenças infecciosas e parasitárias, afetando entre 1 a 3 milhões de pessoas, o que representa entre 1 e 2,4% da população.

Em áreas das zonas urbanas e rurais de municípios selecionados para participar do projeto, a população será convidada a realizar exames de sorologia e de testes rápidos para o diagnóstico da doença. Além de pesquisar quais testes rápidos são mais eficazes, médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem que trabalham em unidades básicas de saúde também terão a oportunidade de avaliar quais tipos de exames são mais fáceis de serem utilizados, obtendo maior eficiência e rapidez nos diagnósticos.

Além da análise de amostras de testes rápidos em laboratório da Unimontes, materiais coletados de pessoas que possam estar acometidos pela doença de Chagas serão encaminhados pela Superintendência Regional de Saúde para análise na Fundação Ezequiel Dias (Funed), em Belo Horizonte. O objetivo será confirmar os diagnósticos, por meio de exames de contra prova. Caso confirmado o diagnóstico, os pacientes serão encaminhados para tratamento e acompanhamento por equipes de Atenção Primária à Saúde (APS).

O projeto Cuida Chagas também vai avaliar o impacto econômico e social que a doença de Chagas causa à população. Até 2025, a previsão é de que o projeto seja implementado em 32 municípios no Brasil, Bolívia, Colômbia e Paraguai, envolvendo 220 unidades de saúde, 235 mil participantes, além de viabilizar o encaminhamento de aproximadamente 9,5 mil pessoas para tratamento.

Por Pedro Ricardo