O Hospital Cristiano Machado (HCM) iniciou sua trajetória na saúde pública com o tratamento da hanseníase em 1944. Três décadas depois, em 1977, se tornou uma das unidades da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), quando teve início a sua transformação assistencial gradativa para o atual perfil de atendimento.

Crédito: Francis Campelo

Há quase duas décadas, o hospital se dedica aos cuidados prolongados a pacientes em reabilitação neurológica, cardiovascular e ortopédica, encaminhados por outras unidades da Fhemig e pelo SUSFácil.

Com uma taxa de ocupação de 85%, parâmetro de eficiência segundo o Ministério da Saúde, o HCM exerce papel relevante também na atenção à demanda reprimida do município de Sabará, onde está localizado, em um processo de parceria e diálogo com a Prefeitura.

A realização de pequenas cirurgias com um volume mensal de cerca de 600 procedimentos, sua atuação no recente surto de dengue tipo C, quando criou uma ala exclusiva com 12 leitos clínicos para atender a mais de uma centena de pacientes com a doença, e a oferta de atendimento fonoaudiológico, desde abril deste ano, para reduzir a fila por essa especialidade, mostram a capacidade do HCM de remodelar sua assistência para suprir as necessidades do seu entorno.

Legado

Acostumada a desafios e atenta à realidade do hospital, a enfermeira Andreza Conceição Lopes Vieira Sete deixou a assistência direta ao paciente para gerir a unidade há quatro anos. Ao lançar um olhar retrospectivo para o HCM, ela entende as mudanças vivenciadas pela unidade em suas oito décadas como “um legado de cuidado, transformação e resiliência”.

A diretora ressalta o papel dos servidores na construção desse legado. “Não podemos deixar de destacar os servidores nesses 80 anos. Os que por aqui passaram e dedicaram muitos anos de sua vida, atendendo com excelência a todos os pacientes; e os que estão aqui hoje e que fazem a diferença para a construção e a expansão dos novos serviços. Eles são primordiais para o sucesso desses 80 anos”.

Trajetória

Atualmente, 187 profissionais trabalham no hospital e praticamente a metade deles (85) pertence à enfermagem, entre auxiliares, técnicos e enfermeiros (45,5%). A trajetória desses trabalhadores se mescla às mudanças vivenciadas pela unidade, principalmente nos últimos 20 anos de sua história, quando as transformações se intensificaram.

Do menino que andava despreocupado pelas ruas de Sabará ao profissional que tem clareza sobre o seu papel para a qualidade de vida dos pacientes que atende, José Maria de Jesus percorreu um longo caminho. Nascido e criado na cidade, casado e pai de duas filhas, o técnico de enfermagem tem 47 anos, 23 deles dedicados ao HCM.

“O Hospital Cristiano Machado faz parte da minha vida. Quando iniciei meu curso de técnico de enfermagem, eu passava de ônibus pela avenida principal da cidade, que fica em frente a ele, olhava para o prédio e pensava: um dia, quero trabalhar nesse hospital. Trabalhar no HCM é realizar um sonho. A longa permanência faz com que nos familiarizemos com os pacientes. Quando você cuida de alguém por oito, dez anos, é como se essa pessoa se tornasse parte da nossa família. O hospital é um campo rico de aprendizado e de convivência com os outros profissionais da saúde. É uma casa na qual nos enriquecemos para a vida. Muitos de nós chegamos ao HCM no início de nossas carreiras. A cada dia, nos tornamos profissionais melhores e pessoas melhores”, pondera.

Paixão

A auxiliar de enfermagem Rosimeire Rodrigues, 50 anos, escolheu o HCM há 20 anos. Casada e sem filhos, ela mora em Santa Luzia e viaja de ônibus por seis horas (entre ida e volta) para trabalhar no hospital, que é a sua primeira experiência profissional. Assim como seu colega José, ela ficou impressionada com a imponência da unidade histórica.
“Quando cheguei na cidade, atravessei a ponte sobre o Rio das Velhas e vi esse prédio com a arquitetura dos anos de 1940, todo preservado, com um pomar maravilhoso e a Mata Atlântica acima, com esquilo, lagarto, frutas etc. Pensei: é aqui que quero ficar e trabalhar. Ao iniciar na unidade, ainda havia pacientes asilares da época da hanseníase.

Ver aquelas pessoas e todo o resgate que o Estado e a sociedade tinham que fazer me apaixonou, fez com que eu permanecesse até hoje, e espero me aposentar aqui”, confidencia.

Rosimeire se recorda de que em 2006, os profissionais do HCM se viram diante de um novo desafio representado pela chegada dos pacientes de longa permanência, “que demandavam um conhecimento maior da equipe, que foi treinada pelos profissionais do Hospital João XXIII. Isso mudou toda a minha perspectiva de trabalho. Saber que eu sou um pedaço pequeno dessa história e que posso agregar com o meu conhecimento algo na vida dessas pessoas é gratificante”, conclui.

Sinais

O enfermeiro Leonardo Brasil, 40 anos, tem metade da experiência profissional de José e Rosimeire e o mesmo entusiasmo de ambos. Casado e sem filhos, ele mora em Belo Horizonte e está há 12 anos no HCM. Assim como os dois colegas, Leonardo iniciou sua carreira na unidade.

“Fui formado por esse hospital maravilhoso, que tem um ambiente reconfortante. São 32 leitos e 32 histórias de vida a serem trabalhadas. São pacientes que, às vezes, não têm nome, não interagem, não verbalizam e não expõem as suas necessidades. A grande maioria demanda de nós a interpretação de sinais. Cabe ao profissional adequar sua comunicação e sua assistência a essa realidade”.

Reconhecimento

Um dos poucos pacientes em condições de falar, o montador de móveis de Ribeirão das Neves, Wendell Wudelbrand dos Reis, 41 anos, casado, pai de seis filhos, é um exemplo do vínculo formado entre quem é cuidado e quem cuida. No HCM desde junho deste ano, Wendell foi vítima de agressão por arma de fogo e esteve internado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do Hospital João XXIII em estado de coma por mais de quatro meses.

“Eu vejo o trabalho deles, a luta para eu alcançar minha superação. Eu acordei sem entender o que estava acontecendo, porque andei por 40 anos e, do nada, tive que ficar em um leito de hospital. As enfermeiras vêm de manhã, os médicos passam todos os dias, fazem os exames, me perguntam como estou me sentindo. Os enfermeiros são abençoados, fazem o possível para eu me sentir em casa. Como não posso tomar banho no chuveiro, eles me dão banho no leito e me fazem sentir como se estivesse no chuveiro, me molhando bastante. Eles são sensacionais, fora do comum. O hospital é maravilhoso. Percebo, a cada dia, que estou melhorando. Sinto um laço de amizade e de carinho com as pessoas que cuidam de mim. Elas me passam segurança. Quando você chega não conhece ninguém, depois de uma semana, já está conversando com todos”, finaliza Wendell.

Por Alexandra Marques (ASCOM Fhemig)