Prevenção e assistência para vida sem tabagismo

“Minha mãe é fumante, cresci com ela fumando pela casa e sempre a criticava por fumar. Quando fui comemorar meu aniversário de 19 anos, estava em uma boate aqui em BH e um amigo estava fumando. Após xingar ele por estar fumando, ele brincou comigo e disse que eu odiava cigarro à toa. Aí por ter bebido demais, tomei o cigarro da mão dele e falei que isso era uma porcaria e que não tem graça nenhuma... Ao colocar o cigarro na boca e dar uma tragada, engasguei, minha pressão baixou e demorei uns 30 minutos pra me recuperar. Assim que melhorei, eu falei que isso ia matar ele se ele continuasse. No outro dia, quando acordei, me veio uma vontade tão grande de fumar de novo. Fomos para uma festa e comprei um cigarro de menta e quando vi já estava comprando um maço”. O início do uso de cigarro pode estar ligado a eventos sociais e entretenimento ou à sensação de alívio em situações de pressão.

“O cigarro é como se fosse aquele amizade de escola que seus pais não gostam, mas que te fazem sentir bem, confiante e ameniza as frustrações, porém à medida que você vai se deixando levar mais você vai se prejudicando sem ver”, esses são os depoimentos do designer gráfico Felipe César de 37 anos. Mas, a decisão de fumar pode estar relacionada a outros contextos. Felipe, morador de Belo Horizonte, e a profissional de Marketing e moradora de Piumhi, Ivony Carolina Alves Batista, 33, não se conhecem. Mas decidiram parar de fumar pelo mesmo motivo: querer ver os filhos crescerem. ”Eu me sentia incapaz de conseguir parar de fumar, pois já tinha tentado várias vezes”, declara Ivony.

“Quando parei de fumar em 2020 foi por perder um cliente. Ele teve um AVC seguido de uma parada cardíaca e não resistiu. Nessa época eu já estava com 1 ano de relacionamento e com dois enteados com mais ou menos a mesma idade da filha desse cliente. Aí me veio o pensamento que poderia ser eu que estaria deixando a minha cônjuge e enteados”, conta Felipe.

Para alertar a respeito dos perigos do tabagismo, incentivar que serviços de saúde e escolas desenvolvam ações conjuntas para prevenir o início do uso de produtos derivados do tabaco, as Secretarias de Estado de Saúde e Educação de Minas Gerais realizam campanhas envolvendo também o tema de cigarros eletrônicos, produto que, mesmo com a venda proibida, atrai novos consumidores.

Imagem criada pelo co-pilot. IA da Microsoft

De acordo com a referência de tabagismo na Unidade Regional de Saúde de Belo Horizonte (URS-BH), Dhebora Lage, esse trabalho conjunto é fundamental “O ambiente escolar é crucial para essas iniciativas de promoção da saúde e prevenção de doenças, especialmente no combate ao tabagismo entre os jovens. É durante a adolescência que muitos começam a fumar, levando à dependência”.

Lage ressalta que, para efetivamente prevenir o uso de cigarros eletrônicos nas escolas, é essencial implementar projetos com abordagens multidimensionais, envolvendo de maneira contínua a escola, a família e a comunidade.” A integração desses esforços é fundamental para garantir que as ações não ocorram de maneira isolada e alcancem seu objetivo com maior eficácia”, afirma.

No contexto da assistência, Lage destaca a estrutura existente nos municípios que compõem a URS-BH. Atualmente são 587 serviços habilitados para a oferta do Programa de Controle do Tabagismo nos 39 municípios da SRS Belo Horizonte, entre Unidades Básicas de Saúde, Postos de Saúde, Hospitais, CAPS e Policlínicas.

A referência regional de tabagismo da URS-BH ressalta também a participação do Ministério da Saúde. “O Ministério da Saúde oferta o tratamento medicamentoso via Assistência Farmacêutica do Estado e também materiais para realização das sessões estruturadas de Terapia Cognitivo Comportamental, e para realização de ações de Educação em saúde e Mobilização Social."

Cigarros Eletrônicos

Os cigarros eletrônicos, conhecidos como vape, pod, e-cigarette, e-cig, pendrive, entre outros nomes, são um dos diferentes tipos de Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEF). O funcionamento dos aparelhos ocorre por meio do aquecimento de uma solução líquida (e-liquid), que pode ou não conter nicotina (sendo que a grande maioria apresenta a substância em diferentes concentrações, incluindo sais de nicotina). Em geral, os líquidos dos cigarros eletrônicos contêm como base: água, aditivos que imprimem sabor e aromas, nicotina, propilenoglicol e glicerina.

Alguns dos perigos desses aparelhos são dependência à nicotina, queimaduras e lesões que podem ser severas, causando convulsões, danos cardiovasculares e pulmonares ou, até mesmo, lesão pulmonar e até a morte do usuário, além de malefícios ao meio ambiente pelo descarte dos insumos.

A Resolução da Diretoria Colegiada RDC Nº 855 de 23/04/2024 proíbe a fabricação, a importação, a comercialização, a distribuição, o armazenamento, o transporte e a propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar (DEF). De acordo com o Ministério da Saúde, com o passar dos anos, evidências científicas vêm se acumulando em relação aos danos causados pelo uso de cigarros eletrônicos.

Segundo pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde e divulgada pela Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), o perfil do fumante de cigarro eletrônico é de adultos do sexo masculino, entre adultos jovens de 18 a 24 anos e entre aqueles com 12 e mais anos de estudo.

A prevalência de adultos que referiram uso de cigarro eletrônico (diariamente ou ocasionalmente) não variou significativamente no período entre 2019 e 2023, mantendo-se relativamente estável. Em 2019, segundo dados da pesquisa realizada pela Global Health Professional Students Survey (GHPSS) e publicada pelo Ministério da Saúde, a prevalência de adultos de 18 a 24 que faziam uso diário ou ocasional de cigarros eletrônicos foi de 7,4%. Já em 2023 o percentual de uso observado nessa faixa etária foi de 6,1%.

Custos atribuíveis ao tabagismo

Nova publicação do Instituto de Efetividade Clínica e Sanitária (IECS) em 2020 estimou que no Brasil as doenças causadas pelo tabagismo custam R$ 125.148 bilhões ao ano (Pinto et al, 2020), ou seja, o equivalente a 23% do que o país gastou em 2020 para enfrentar a pandemia da Covid-19 (R$ 524 bilhões) (Tesouro Nacional Transparente, 2020).

Segundo o Instituto de Câncer (INCA), esses custos são ainda maiores pois não incluem os gastos com ações de prevenção e tratamento para cessação do tabagismo, nem de prevenção e mitigação dos danos sanitários, sociais e ambientais decorrentes da produção de tabaco e do mercado ilegal de tabaco.

Por Leandro Heringer