Há quatro anos, as gestantes atendidas pela Clínica da Mulher – serviço que centraliza o pré-natal no município de Três Corações (MG), participam do Programa de Controle da Toxoplasmose Congênita de Minas Gerais (PCTC-MG). A iniciativa, criada em 2013 pela Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) e executada pelo Nupad da Faculdade de Medicina da UFMG, garante às gestantes de todo o estado a realização gratuita dos exames necessários para a prevenção e o diagnóstico da toxoplasmose aguda na gestação. A infecção que, no adulto, evolui geralmente sem causar sintomas, pode provocar sérios danos ao bebê quando transmitida pela mãe na gestação, sendo denominada, neste caso, toxoplasmose congênita.

Foto: Rafaella Arruda

Cristiane Aparecida é uma das mais de 2300 gestantes triadas no município a partir do PCTC-MG. Ela está no final de sua quinta gestação e compareceu à Clínica da Mulher, no início de abril, para fazer a quarta e última coleta de sangue para o controle da toxoplasmose. Como os primeiros resultados do pré-natal indicaram que Cristiane não havia adquirido a toxoplasmose, sendo, portanto, suscetível à infecção, os exames precisaram ser repetidos ao longo de toda a gravidez e a gestante orientada sobre como evitar a exposição às fontes mais comuns de infecção a partir de bons hábitos de higiene pessoal e alimentar. “O importante é descobrir se tem alguma coisa, né? Porque a gente não sabe. A gente previne, mas ter certeza de que não tem nada, só fazendo exame mesmo”, afirma a gestante.

Assim como Cristiane, mais da metade das mulheres triadas na Clínica da Mulher para a toxoplasmose foram identificadas como suscetíveis e orientadas a repetir a coleta. Ao todo, entre março de 2013, mês em que Três Corações se cadastrou no PCTC-MG, e abril de 2017, a unidade de saúde realizou mais de 4 mil exames, entre primeiras e novas amostras. Segundo a responsável técnica da Clínica, Luana Muquem, este é o cenário que apresenta a maior dificuldade para a equipe de Enfermagem, pois muitas mulheres não entendem o porquê da repetição dos exames: “Falamos bem detalhado que é uma precaução, que a imunidade da gestante é baixa e se ela tiver contato com o parasito pode ter a doença”.

Para aumentar a adesão nesses casos, a estratégia usada pelo serviço de referência é fazer a primeira coleta da toxoplasmose no ato do cadastro da usuária para o pré-natal e anotar as datas para coletas posteriores no cartão espelho das gestantes, realizando-as no momento da pré-consulta durante as visitas seguintes. “É raro elas virem fora do dia da consulta. Então só damos baixa no cartão quando ela realiza a coleta, se não ela fica em atraso e o profissional vê no momento de atendê-la, assim fica difícil a gestante ‘escapar’ e não proceder à coleta”, explica Luana. A enfermeira cita também que a mudança da Clínica para a região central da cidade, há cerca de um ano, favoreceu a adesão e o aumento no número de mulheres atendidas de forma geral: “Antes a adesão era menor, pois estávamos mais longe. Hoje os atendimentos aumentaram. Em relação às gestantes, 801 iniciaram o pré-natal em 2016. Este ano, de janeiro ao início de abril, já foram 226”.

Diagnóstico e Tratamento

Após a coleta para a toxoplasmose, a Vigilância Epidemiológica de Três Corações, localizada no Centro de Especialidades Médicas do município, envia as amostras para análise no laboratório do Nupad, em Belo Horizonte. “A Vigilância também agenda a coleta da amostra em soro, no caso de resultado alterado”, explica Luana. Caso se confirme a doença, a gestante é encaminhada para tratamento com médico infectologista no Serviço de Atendimento Especializado (SAE), outra unidade de atenção especializada da cidade. O tratamento, garantido pelo PCTC-MG, busca reduzir ou mesmo prevenir danos ao feto pela toxoplasmose congênita, como sequelas oculares e neurológicas.

A enfermeira relata o exemplo de Ariele Gonçalves, de 21 anos, que realizou a primeira coleta de sangue na Clínica da Mulher em julho de 2016 e, menos de 30 dias depois, foi orientada a fazer o exame sorológico, para confirmar a infecção. “Após o resultado compatível com a infeção aguda para a toxoplasmose, foi feito contato com o SAE e marcada consulta da gestante com infectologista, além da consulta com obstetra para conduta e avaliação. Foi um controle bem feito”, pontua.

“Ariele veio para o SAE no terceiro mês de gestação. O médico entrou com a medicação até a 25ª semana gestacional”, conta a enfermeira do Serviço, Alba Valéria. Após o tratamento, o ultrassom morfológico não identificou alterações no feto. O parto ocorreu no início de março. Segundo Ariele, a filha Allana ainda ficou na maternidade por cinco dias, onde outros exames foram realizados. A triagem neonatal (teste do pezinho), feita pelo Nupad, foi negativa para a toxoplasmose congênita.

Para os profissionais envolvidos com o controle da toxoplasmose em Três Corações, a história de Ariele ilustra a importância do Programa. “Antes de 2013 não tinha esse controle, muitas crianças ou mesmo gestante não tinham o tratamento que têm hoje, acompanhamento com infectologista, medicação. As crianças nasciam com deficiência exatamente pela doença. Alguns médicos até pediam os exames, esporadicamente, mas não era protocolo”, conta a técnica de enfermagem Fabiana Melo, que está há 13 anos na Clínica da Mulher. Segundo um dos obstetras da unidade, Celso Dias, nenhum caso para a toxoplasmose passou despercebido após o Programa. “A maioria das gestantes se preocupa, mas se elas não vêm (para a coleta), as enfermeiras vão atrás”, brinca.

Crianças acompanhadas 

Emanuelly Isadora, de 2 anos, foi identificada com toxoplasmose congênita após o nascimento. A mãe, Taila Rodrigues, moradora de Três Corações, fez o controle durante a gestação, mas a infecção só ocorreu nos últimos dias da gravidez, o que, apesar de impossibilitar o tratamento no pré-natal, contribuiu para evitar que a criança desenvolvesse sequelas mais graves.

Com o diagnóstico confirmado pela triagem neonatal, Emanuelly passou a ser tratada e acompanhada gratuitamente no Hospital das Clínicas da UFMG, em Belo Horizonte, também a partir do PCTC-MG. Até o momento, Emanuelly já compareceu a três consultas, durante as quais foram feitos exames de sangue para controle da doença e atendimento com pediatra, oftalmologista e otorrinolaringologista. “Para mim é um conforto saber que tem esse apoio, que tenho para onde correr no momento de dúvida. No começo foi muito difícil, nem tanto pela toxoplasmose, mas pelo susto no nascimento dela. Agora estou tranquila”, afirma a mãe.

A técnica de enfermagem da Vigilância Epidemiológica de Três Corações, Patrícia Batista, responsável por agendar as consultas de jovens do município em acompanhamento para as doenças identificadas pela triagem neonatal e comunicá-las às famílias, conta que, além de Emanuelly, outras três crianças fazem o controle em Belo Horizonte para a toxoplasmose congênita. Duas delas, de 10 anos, foram diagnosticadas durante projeto piloto para implementação do PCTC-MG e também estão com as consultas em dia: “Quando você vê o resultado é gratificante, vê que valeu a pena o esforço, que a criança está bem, e isso é o que importa”.

Por ASCOM Nupad

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