O Hospital Eduardo de Menezes (HEM), da Fundação Hospitalar de Minas Gerais, recebeu na última quarta-feira (17), o coordenador da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) do Conselho Nacional de Saúde (CNS), o médico Jorge Alves de Almeida Venâncio, para falar sobre ética em pesquisa em situações de epidemia.

palestra hem conep

A palestra aconteceu no auditório do HEM e contou com a participação de representantes da Secretaria de Estado de Minas Gerais, de pesquisadores e membros de comitês de ética do HEM, Funed, Fiocruz, UFMG, além da Gerência de Ensino e Pesquisa e do Comitê de Ética em Pesquisa da Administração Central da Fhemig, e de servidores de vários setores do HEM.

O convite ao coordenador da Conep foi motivado pelo recente surto de febre amarela vivenciado pelo Estado de Minas Gerais, nos dois primeiros meses deste ano, durante o qual coube ao HEM, referência estadual para o tratamento de doenças infectocontagiosas, o atendimento aos casos mais graves. O desempenho do hospital na atenção aos pacientes com suspeita da doença contribuiu para a elaboração das diretrizes técnicas de manejo da febre amarela – documento inédito no país, e que contou com o trabalho conjunto do HEM (Fhemig), da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) e da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).

Outra perspectiva

A grande taxa de mortalidade da doença exigiu o aperfeiçoamento diário da capacidade de resposta da equipe de profissionais do HEM. Diariamente, as medidas adotadas eram revistas, a fim de se superar os obstáculos que surgiam e reduzir os óbitos. Assim, a ordem em que determinados procedimentos foram realizados contribuiu para o alcance desse objetivo, como sublinhou a diretora do HEM, Thaysa Drummond. De acordo com o diretor técnico do hospital, Dario Ramalho, o surto levou os profissionais a enxergarem “coisas que não enxergávamos antes”.
Diante desse cenário, os quase três meses que sucederam ao período de pico da doença foram dedicados à reflexão mais aprofundada sobre o momento paradigmático vivenciado pelos profissionais que atuaram na linha de frente de combate ao surto.

Investir em pesquisa

Das indagações conjuntas resultou o desejo de investir em pesquisa, tendo como objeto de estudo o êxito alcançado na atenção aos casos mais complexos, do maior surto de febre amarela desde a década de 1980, quando teve início a disponibilização de informações estatísticas sobre a enfermidade.

Jorge Venâncio iniciou a palestra perguntando aos presentes sobre a função do sistema de regulação ética, e deixou claro que sua função é a proteção do doente que participa de uma pesquisa clínica. Segundo ele, nessas circunstâncias, as pessoas estão numa situação limite e sua maior, senão a única, preocupação é preservar sua vida, e não se seus direitos estão sendo respeitados.

Tal função cabe aos comitês de ética em pesquisa que, em Minas Gerais, somam, atualmente, 85.

Direitos definidos

O coordenador da Conep lembrou a todos que a relação entre o pesquisador e o participante de pesquisas na saúde é diferente das demais áreas e é necessário que os direitos do pesquisado estejam muito bem definidos. Na área da saúde, ao contrário dos outros campos, sair da metodologia representa incorrer em risco sem a garantia de benefício. Venâncio ressaltou que a metodologia deve ser objeto de análise dos comitês de ética somente quando significar risco para o participante da pesquisa.

Urgência epidemiológica

Especificamente em relação à pesquisa em situação de urgência epidemiológica, Jorge Venâncio destacou dois pontos centrais: o acesso aos prontuários e a formação de biobancos, reservatórios de longa duração, que armazenam materiais biológicos que podem ser utilizados em várias pesquisas.

Segundo ele, o ideal é o pesquisador conseguir o termo de consentimento com o paciente. De todo modo, o pesquisador somente deve extrair dos prontuários dados anonimizados, que, em nenhuma hipótese, possam permitir a identificação do paciente. Outro fator central nessas circunstâncias é sempre haver consonância entre o interesse da pesquisa para a coletividade e a defesa dos direitos do participante, pois um não pode se sobrepor ao outro.

Biobancos

Venâncio afirmou que a presença de biobancos é um grande facilitador para as pesquisas, pois permite acumular material independente de seu uso imediato. Ele explicou ainda, que as pessoas que cedem material podem definir entre uma autorização genérica ou específica para determinada pesquisa. No entanto, para que os biobancos sejam efetivos é fundamental que os termos de consentimento sejam genéricos, o que, na prática, costuma ocorrer. Mas é fundamental que os pesquisadores tenham clareza quanto ao fato de que o consentimento genérico somente é aplicável aos biobancos registrados, cuja decisão de uso compete aos comitês de ética.

Por Alexandra Marques (Fhemig)